Frei Daniel Kromer, “escoteiro de Deus”, “servo dos hansenianos” e grande entusiasta do Ramo Pioneiro

Rubem Perlingeiro
Rubem Perlingeiro
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Frei Daniel Kromer

Rubem Perlingeiro

Nascido na Polônia, em 28.07.1909, e falecido no Rio de Janeiro, em 22.04.1999, Frei Daniel Kromer foi descrito por seus confrades como “escoteiro de Deus e servo dos hansenianos”

Ingressou na Ordem dos Frades Menores em 1927 e veio para o Brasil em 1933.

A partir de 1940, Frei Daniel passou a dedicar sua vida aos portadores de hanseníase. 

Apresentou-se como voluntário para esse trabalho e, desde o início, lutou contra o preconceito.

Naquele período, o Brasil tinha adotado o modelo norueguês de combate à doença promovendo o isolamento dos contaminados em colônias ou sanatórios, da mesma forma que no tratamento psiquiátrico.

Frei Daniel lançou mão de propostas terapêuticas inovadoras à época (que chamamos hoje de “terapia ocupacional”), usando o teatro e o Escotismo para ajudar na recuperação dos enfermos.  

Ficaram famosas as encenações ao ar livre da Paixão de Cristo que organizou nos tempos em que trabalhou no Hospital Colônia Santa Teresa, na cidade de São Pedro de Alcântara (SC).

Em uma delas, em 1952, 350 atores hansenianos foram assistidos por uma plateia de quase 20 mil pessoas. A encenação teve repercussões até no exterior e foi festejada pela imprensa como “o maior acontecimento teatral do Brasil” daquele ano.

No Hospital Colônia Santa Teresa, Frei Daniel criou a primeira tropa de escoteiros hansenianos, que chegou a contar com dezenas de jovens.

Além da Colônia Santa Teresa, Frei Daniel trabalhou no Sanatório de São Roque, Piraquara (PR), e no Sanatório Tavares de Macedo, em Venda das Pedras (RJ), sempre desenvolvendo um trabalho mais humano com os portadores de hanseníase nos lugares em que atuou. Ele foi uma referência no tratamento dos hansenianos, tendo obtido, em 1954, uma bolsa para estudar na Europa os tratamentos que eram oferecidos na época.

Frei Daniel também teve atuação destacada no Movimento Escoteiro. Fez o Curso da Insígnia de Madeira em Gilwell Park, na Inglaterra, foi Assistente Regional Religioso do antigo Estado da Guanabara e Comissário Nacional do Ramo Pioneiro. 

De acordo com os registros da sua Ficha 120:

  • fez a promessa escoteira no Brasil em 23.04.1941;
  • fez o Curso da Insígnia de Madeira na Inglaterra em 1954; 
  • foi membro do Conselho Regional da Região Escoteira de Santa Catarina no período de 1954 a 1956;
  • recebeu a Medalha de Gratidão Prata em 31.12.1958;
  • foi nomeado Assistente Regional Religioso da Guanabara em 07.08.1961 e Comissário Nacional do Ramo Pioneiro em 13.07.1962.

Como Comissário Nacional do Ramo Pioneiro, iniciou a publicação do boletim “Ponte Pioneira” como encarte da Revista Sempre Alerta, estimulando o desenvolvimento do Ramo. Escreveu o primeiro artigo na edição de março-abril de 1962 (pp. 10 e 11), em que destacou a importância de os jovens serem Pioneiros para poderem desenvolver sua responsabilidade social: 

É absurdo e anormal querer dispensar [os jovens] daquela quarta fase que é o Escotismo em plenitude. Nada mais lógico que é o Pioneirismo quem decide sobre o sucesso ou fracasso do Método Escoteiro para a formação de uma cidadania efetiva.

Nem o mais zeloso Akelá nem o mais abnegado Chefe de Escoteiros deveriam sentir-se satisfeitos enquanto não reencontrarem, um dia, os seus antigos Lobinhos e Escoteiros integrando um Clã e, indubitavelmente, pobrezinhos daqueles Lobinhos e daqueles Escoteiros que desde cedo não foram levados pelos seus chefes a sonhar e almejar ardentemente ser, um dia, Pioneiros.

(…)

Contra as alarmantes falhas de personalidades e de responsabilidade social que a crescente mecanização e organização coletivizadora introduziu nas famílias e na sociedade, as diretrizes do novo P.O.R. para o Pioneiro aponta ostensivamente o apto antídoto reclamando com a mesma ênfase e ao lado do essencial e característico fator escoteiro Natureza, um segundo fator que é o desenvolvimento imperioso da Responsabilidade Social.

Por ora, deixo aqui minha firme convicção de que o mundo será melhor (nosso pequeno Mundo escoteiro, assim como aquele Mundo mundano), não porque nós, Escotistas velhos, existimos, mas antes porque existe uma maneira atualíssima e atualizadíssima: o Pioneirismo do novo P.O.R. e porque, hoje ainda e mormente, existem jovens que através de um honroso Compromisso se engajariam, e realmente se engajam, numa comunidade, num Clã, não para se isolar vaidosamente dos outros, mas para se obrigar com a sociedade pela qual se lhes despertou um conceito e um sentimento de responsabilidade.

Frei Daniel era adepto da ginástica do riso: “este é o melhor remédio para o reumatismo e esclerose” e costumava dizer: “o povo precisa mais de carinho e menos de doutrina”.

Frei Neylor J. Tonin, um dos frades franciscanos que trabalham e residem no Convento Santo Antônio do Largo da Carioca, no Rio de Janeiro, onde Frei Daniel viveu seus últimos anos e está sepultado, escreveu o necrológio dele por ocasião do seu falecimento e colheu alguns depoimentos. 

Egídio de Souza Rodrigues, um dos depoentes do necrológio, disse: “ele era uma pessoa de Deus, de muita fé e visível espiritualidade. O que me encantava em Frei Daniel era o fato de ele gostar de crianças e ter uma alma de escoteiro, sempre alerta e incansável.

Que, com o tempo, possamos conhecer mais sobre a vida do Frei Daniel, esse “escoteiro de Deus”, “servo dos hansenianos” e grande entusiasta do Ramo Pioneiro.

Fontes: 

a) Necrológio (biografia) de Frei Daniel Kromer, preparado por Frei Neylor J. Tonin. 

b) Pequeno histórico da sua trajetória, preparado por Frei Antônio Michels.

c) Ficha 120, arquivada no Centro Cultural do Movimento Escoteiro.

d) Jornal Correio da Manhã, de 13.06.1954.

e) Revista Sempre Alerta, edição de março-abril de 1962 (pp. 10 e 11).

f) Ata da 1ª Reunião da Diretoria Regional do Paraná de 28.08.1952.

f) “Laços no Exílio: Ações Socioeducativas no Leprosário Colônia Santa Teresa (Santa Catarina – 1936-1952)”, dissertação de mestrado de Simone Aparecida Ribeiro de Lima. 

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